Qual a relação dos transtornos psiquiátricos com o comportamento suicida?

| 13 outubro 2022 | ID: sofs-45143
Solicitante:
CIAP2:
DeCS/MeSH: , , ,

É importante considerar que no comportamento suicida os transtornos mentais são apenas um dos fatores associados. O suicídio, portanto, é um fenômeno multideterminado, ou seja, determinado por diversos fatores(1). Ainda assim, dentre as condições (transtornos) psiquiátricas que devem ser consideradas destacam-se:
-Transtorno de personalidade;
-Transtornos por uso de substâncias psicoativas (fator predisponente ou gatilho);
-Transtornos relacionados ao trauma e/ou estresse (por exemplo, o Transtorno do Estresse Pós-Traumático);
-Transtornos dissociativos;
-Transtornos de ansiedade (principalmente ansiedade social, transtorno do pânico e transtornos de ansiedade generalizada);
-Transtornos obsessivo-compulsivos (quanto maior a gravidade dos sintomas maior o risco);
-Esquizofrenia e outros transtornos psicóticos;
-Transtornos alimentares; -Declínio cognitivo (jovens com deficiência intelectual – menor risco – e idosos com prejuízos cognitivos por quadros neurodegenerativos – maior risco);
-Transtornos de sexualidade (principalmente quando associadas a vítimas de violência sexual por parceiro íntimo e casos de abuso sexual infantil);
-Transtornos de sono (insônia e pesadelos)(2).

O comportamento suicida é definido por morte autoprovocada com evidências de que a pessoa pretendia morrer, de forma consciente e intencional. É caracterizada por pensamentos de morte, ideação suicida (pensamento de causar sua própria morte), tentativa de suicídio e/ou suicídio consumado. Trata-se de uma condição responsável pela segunda maior causa de morte em crianças e adolescentes em todo o mundo(3).

Segundo estimativas da Organização Mundial de Saúde quase um milhão de mortes por suicídio ocorreram em 2016 e as estimativas sugerem que 10 a 20 vezes mais pessoas tentaram suicídio(4). Importante considerar que nem todo comportamento suicida está associado a transtornos psiquiátricos e que a experiência de desejo de morrer pode estar presente frente a diversas situações difíceis da vida (como por exemplo, em crises de saúde mental)(2,5).

No entanto, é vital destacar que o suicídio é um problema de saúde pública evitável e sua prevenção aumenta de forma considerável a expectativa e a qualidade de vida. Para o desenvolvimento dessas estratégias de prevenção torna-se essencial compreender que como um evento multideterminado os suicídios apresentam um conjunto amplo de fatores de risco e/ou vulnerabilidade, mas por uma questão didática podemos dividir esses fatores em quatro grandes categorias: demográficas, diagnósticas, histórico psiquiátrico e psicológicas/sociais(1).

Na categoria demográfica estão as variáveis de menor interesse clínico, pois esses fatores não podem ser modificados. No entanto, para efeitos de rastreio devem ser considerados. Os mais relevantes são idade – a população mais jovem tem maior risco – e gênero – os homens são 75% mais propensos a morrer devido o suicídio do que as mulheres(1,4).

Em relação as categorias diagnósticas. A existência de doenças físicas não aumenta por si só o risco de suicídio, mas são fatores que predispõem a ativação tanto de fatores psicológicos, por exemplo a desesperança e a falta de sentido percebido para a vida e a perda de papeis sociais, como o agravamento de transtornos psiquiátricos(6).

Em relação ao histórico psiquiátrico, embora a literatura saliente que nem todos os casos de suicídio e/ou comportamento suicida estejam relacionados a transtornos psiquiátricos é vital considerar essa questão na avaliação dos usuários dos serviços de saúde(1). Alguns estudos estimam que cerca de 97% dos indivíduos que morrem de suicídio são diagnosticados com ou mais transtornos psiquiátricos(7).

Por fim os fatores psicológicos são compreendidos de forma diversa a depender do tipo de abordagem utilizada (psicanálise, psicologia sócio-histórica, psicologia cognitivo-comportamental, dentre outras). No entanto, independente da abordagem existe um consenso que esses fatores devem ser levados em conta por serem passiveis de modificação por meio de intervenções psicoterapêuticas(1).

Dessa forma, algumas  características psicológicas são relevantes de serem observadas por sua ligação como fatores predisponentes e/ou precipitantes para o suicídio, Dentre eles podemos citar: histórico de suicídio na família, abuso sexual na infância, comportamento de isolamento social, comportamento agressivo e/ou impulsivo, desilusão amorosa, presença de conflitos relacionais, separações conjugais, problemas financeiros e/ou perca de emprego, personalidade perfeccionista e/ou pessimista e estresse crônico/excessivo(5,8,9).

Bibliografia Selecionada:

1. Meleiro AMAS, Teng CT. Suicídio: Estudos Fundamentais. Editora Segmento farma, 2004, 220 páginas.

2. Damiano FD, Luciano AC, Cruz IDG, et al [editores]. Compreendendo o suicídio. Editora Manole, 2021; 1. ed.

3. Brahmbhatt K, Kurtz BP, Afzal Kl, et al. Suicide risk screening in pedriatric hospitals: clinical pathways to address a global health crisis. Psychosomatics. 2019 Jan-Feb;60(1):1-9. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC7898193/

4. World Health Organization (WHO). World health statistics 2018: monitoring health for the SDGs, sustainable development goals. 2018. Disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/272596/9789241565585-eng.pdf?ua=1

5. Meleiro AMAS, Correa H. Comportamento suicida. In: Meleiro AMAS. Psiquiatria: estudos fundamentais. Guanabara Koogan, 2018; 1a ed.; [acesso em 01 de setembro de 2022).

6. Levenson JL, Bostwick JM. Suicidality in the medically ill. Primary Psychiatry. 2005 Mar 1;12(3):16-18.

7. Bertolote JM, Fleischmann A, De Leo D, Wasserman D. Suicide and mental disorders: do we know enough? Br J Psychiatry. 2003 Nov;183:382-3. Disponível em: https://www.cambridge.org/core/product/identifier/S0007125000028142/type/journal_article

8. Wenzel A, Brow GK, Beck AT. Terapia cognitivo comportamental para pacientes suicidas. Porto Alegre:Artmed. 1 ed., 2010: 304p.

9. King CA, Berona J, Czyz E, Horwitz AG, Gipson PY. Identifying adolescents at highly elevated risk for suicidal behavior in the emergency department. J Child Adolesc Psychopharmacol. 2015 Mar;25(2):100-8. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4367522/