Qual a melhor abordagem de crianças vítimas de abuso sexual?

| 12 abril 2022 | ID: sofs-44890
Solicitante:
CIAP2:
DeCS/MeSH:

A resposta à violência sexual contra crianças e adolescentes é multissetorial, com a saúde, justiça/polícia e bem-estar social/proteção infantis: escuta especializada, exame médico clínico, exame pericial, assistência socioassistenciais e assistência psicólgica(1,2).  O fluxo de atendimento à vítima inclui acionar o Conselho Tutelar (averiguação domiciliar ou institucional e discussão com seu colegiado para tomada de decisões) e  os cuidados clínicos, sócio assistencial e psicológicos imediatos e de longo prazo para a redução das consequências negativas para a saúde e a melhoraria do bem-estar(1,2). Para crianças e adolescentes que apresentam sintomas de transtorno de estresse pós-traumático (PTSD), distúrbios comportamentais e/ou emocionais após a violência sexual, a terapia cognitivo-comportamental (TCC) com foco no trauma pode ser considerada(1). O debriefing psicológico não deve ser usado na tentativa de reduzir o risco de estresse pós-traumático e sintomas de ansiedade ou depressão(1).


O fluxo de encaminhamento:

Para proteção da vítima, foi instituída a abordagem da Escuta Especializada da Lei 13.431/17 e Decreto 9.603/2018, cujo objetivo principal é a proteção íntegra da vítima e não o de coletar provas da violência sexual sofrida (entretanto, se durante o relato forem narrados indícios da materialidade e da autoria do crime, o relatório poderá ser usado como prova judicialmente) com os seguintes parâmetros(2):

· A escuta especializada é feita perante órgão da Rede de Proteção;

· A escuta especializada é um procedimento da entrevista;

· A entrevista versa sobre a situação de violência sofrida pela criança ou adolescente, envolvendo respeito, empatia e validação às informações fornecidas, perguntas sobre as preocupações ou necessidade da vítima;

· Na entrevista, apoio emocional e prático, facilitando o acesso a serviços psicossociais, é fundamental, como também as informações adequadas à idade sobre o que será feito para atendê-los, incluindo a necessidade de relatar o abuso às autoridades relevantes.

 

A linha de cuidado deve garantir o atendimento as vítimas em tempo hábil e de acordo com suas necessidades e desejos; priorizar as  necessidades médicas imediatas e suporte de primeira linha; tornar  o ambiente e a maneira como os cuidados estão sendo prestados adequados à idade, bem como sensível às necessidades daqueles que enfrentam discriminação relacionada à orientação sexual; minimizar a necessidade das vítimas se deslocarem a vários pontos de atendimento dentro da unidade de saúde; capacitar cuidadores na compreensão de possíveis sintomas e comportamentos que a criança ou adolescente pode apresentar nos próximos dias ou meses e quando buscar mais ajuda(1).

 

Após o abuso sexual infantil, as providencias clínica e periciais a serem tomadas incluem(2):

· Em até 72 horas – a) exame clínico realizado no hospital incluindo contracepção de emergência (para evitar uma possível gravidez da vítima) e profilaxia de infecções sexualmente transmissíveis (IST); b) exames periciais (obrigatoriamente por um Médico-Legista) que podem ser feitos no Instituto Médico Legal (IML) no hospital onde a vítima se encontra.

· Após 72 horas – a) exame clínico na Unidade de Saúde incluindo teste de gravidez, diagnóstico e profilaxia e tratamento de infecções sexualmente transmissíveis (IST); b) exames periciais no IML.

 

O atendimento socioassistencial faz parte da linha de cuidado da criança e adolescente vítima de abuso sexual no Sistema Único de Assistência Social (SUAS).  Duas unidades do SUAS são essenciais para a proteção de vítimas de violência: a) O Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), que atua na prevenção de riscos sociais e de violações de direitos por meio de identificação de sinais, realizando atividades de orientação e encaminhamento; b) O Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), que atua diretamente no enfrentamento de violações de direitos, inclusive abuso sexual. Realiza o acompanhamento da criança/adolescente e de sua família, promovendo(2):

· Apoio, orientação e acompanhamento do caso concreto, articulando os serviços socioassistenciais com as diversas políticas públicas e com órgãos do sistema de garantia de direitos;

· Desenvolvimento do Plano de Acompanhamento Familiar;

· Acompanhamento da família por meio de atendimentos individuais, familiares ou em grupo;

· Orientação sociojurídica;

· Visitas domiciliares.

 

Na ausência de um responsável legal da criança que sofreu abuso sexual e for constatada a necessidade de afastamento do núcleo familiar, o conselho tutelar deve elaborar relatório descrevendo os motivos da necessidade de afastamento e as providências tomadas e comunicar imediatamente o fato ao Ministério Público. Nos casos em que não houver membro da família extensa com possibilidade de acolher de forma segura a criança ou adolescente, o Ministério Público solicita ao juízo da infância e juventude o encaminhamento da criança ou adolescente a serviço de acolhimento em família acolhedora ou acolhimento institucional. Nos casos de urgência de acolhimento imediato, o Conselho Tutelar, em caráter excepcional, pode solicitar o acolhimento da vítima, e comunicar ao Juiz da Vara de Infância e Juventude que, após ouvir o Ministério Público, manterá ou não o acolhimento(2).

 

Quando a criança ou adolescente vítima de abuso sexual tem responsável legal que a proteja, o Conselho Tutelar deve orientar o responsável legal não agressor a registrar um Boletim de Ocorrência na Delegacia de Polícia e regularizar a situação jurídica da vítima, por meio de um advogado na Defensoria Pública ou Centro de Defesa (OSC). São exemplos de medidas legais que podem ser adotadas: guarda unilateral; retirada do agressor da casa; restrição de visita ou visita vigiada; destituição do poder familiar, dentre outras(2).

 

Uma vez constatado que a criança ou o adolescente vítima de abuso sexual está em risco, a autoridade policial deve ser acionada que solicitar à autoridade judicial responsável, em qualquer momento dos procedimentos de investigação e responsabilização dos suspeitos, as medidas de proteção(2):

· Evitar o contato direto da criança ou do adolescente vítima ou testemunha de violência com o suposto autor da violência;

· Solicitar o afastamento cautelar do investigado da residência ou local de convivência, em se tratando de pessoa que tenha contato com a criança ou o adolescente;

· Requerer a prisão preventiva do investigado, quando houver suficientes indícios de ameaça à criança ou adolescente vítima ou testemunha de violência;

· Solicitar aos órgãos socioassistenciais a inclusão da vítima e de sua família nos atendimentos a que têm direito;

· Requerer a inclusão da criança ou do adolescente em programa de proteção a vítimas ou testemunhas ameaçadas;

· Representar ao Ministério Público para que proponha ação cautelar de antecipação de prova, resguardados os pressupostos legais e as garantias previstas no art. 5º Lei 13.431/17.

Bibliografia Selecionada:

1. World Health Organization (WHO). [internet]. Responding to children and adolescents who have been sexually abused: WHO clinical guidelines. Geneva: ISBN: 9789241550147; [Acesso em 05 jan 2022].  2017:86p. Disponível em: https://apps.who.int/iris/handle/10665/259270

2. Brasil. Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos [internet]. Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente.  Abuso sexual contra crianças e adolescentes – abordagem de casos concretos em uma perspectiva multidisciplinar e interinstitucional. [acesso em 05 jan 2022]. Brasília; 2021:30p. Disponível em: https://www.gov.br/mdh/pt-br/assuntos/noticias/2021/maio/CartilhaMaioLaranja2021.pdf