Quando há sangramento uterino anormal, a avaliação sempre começa com anamnese detalhada (buscando caracterizar o padrão menstrual em quantidade, duração e tempo de um ciclo para o outro) e exame físico minucioso (incluindo exame pélvico/ginecológico).
Um largo espectro de doenças se manifesta como sangramento uterino anormal. A irregularidade menstrual é comum na adolescência. Cerca de 50% dos ciclos menstruais são anovulatórios nos primeiros dois anos após a menarca¹. Nesta fase, são causas frequentes de irregularidades menstruais: a imaturidade do eixo hipotálamo-hipófise-ovariano, as discrasias sanguíneas, gravidez e processos infecciosos gênito-urinários. A conduta terapêutica é baseada nos achados clínicos de cada condição.
Os exames complementares estão indicados quando houver suspeita de doenças relacionadas. Nestes casos, de acordo com as suspeitas clínicas, podem ser solicitados: hormônio tireoestimulante (TSH), tiroxina (T4 livre), coagulograma, contagem de plaquetas, provas de função hepática e prolactina, bem como uma ultrassonografia pélvica (para avaliação da espessura endometrial, do miométrio, da forma e do volume do útero e dos anexos). Para alguns autores, a dosagem quantitativa da subunidade beta da gonadotrofina coriônica humana (beta-HCG) deve ser solicitada a todas as mulheres em idade reprodutiva, mesmo que elas neguem vida sexual ativa ².
Atenção para o fato de que distúrbios menstruais podem ocasionar anemia, dependendo das características do sangramento (em geral, sangramentos persistentes e/ou volumosos). Nesta situação, convém avaliação hematológica, através de um hemograma ³.
A menstruação é um sangramento cíclico que se repete a cada 25 a 35 dias, com duração de 2 a 7 dias, que leva a uma perda sanguínea de 20 a 80 mL. Um terço desse volume é representado por sangue, sendo o restante composto por fluidos endometriais. Qualquer sangramento uterino que não tenha essas características é anormal (1-5).
Menorragia é o fluxo menstrual excessivo, com perda de sangue maior que 80 mL. Como é difícil quantificar clinicamente a perda de sangue menstrual, o diagnóstico de menorragia é baseado primariamente na história da paciente de volume ou duração excessivos de fluxo menstrual (2,4).
Metrorragia é o sangramento uterino irregular, fora do período menstrual. Na polimenorreia, os ciclos têm intervalos menores que 24 dias e na oligomenorreia, maiores que 40 dias. Amenorreia é a ausência de menstruação. As menorragias são a tradução de sangramentos de origem funcional, excluindo, por definição, as causas orgânicas. As metrorragias são mais frequentemente secundarias à patologia orgânica. As menometrorragias são a conjugação destas duas situações (2,4).
O termo “sangramento uterino anormal” é abrangente e multietiológico, podendo ser causado por uma grande variedade de doenças locais ou sistêmicas. Em linhas gerais, sua etiologia pode ser dividida em duas grandes categorias (2,4):
Na adolescência, além do sangramento uterino anovulatório, devido à imaturidade do eixo hipotálamo-hipófise-ovariano próprio da faixa etária, anormalidades hematológicas devem ser sempre consideradas na propedêutica do sangramento anormal. A menarca é, para muitas adolescentes, a primeira oportunidade que terão de testar seus mecanismos de coagulação; por isso, patologias como doença de Von Willebrand, deficiência de protrombina, púrpura trombocitopênica idiopática, ou distúrbios que levam à deficiência ou disfunção plaquetárias, como leucemias e hiperesplenismo, muitas vezes só serão suspeitados ou diagnosticados nesse período. A afecção mais diagnosticada é a púrpura trombocitopênica idiopática, seguida pela doença de Von Willebrand (2,6), as quais devem ser acompanhadas conjuntamente com o hematologista.