Quais os sinais e sintomas do autismo e quais orientações acerca do tratamento para as famílias de autistas?

| 31 maio 2016 | ID: sofs-23674
Solicitante:
CIAP2: ,
DeCS/MeSH:
Graus da Evidência:

O autismo pode manifestar-se desde os primeiros dias de vida, mas é comum pais relatarem que a criança passou por um período de normalidade anteriormente à manifestação dos sintomas (1-3). Normalmente, o que chama a atenção dos pais inicialmente é que a criança é excessivamente calma e sonolenta ou então que chora sem consolo durante prolongados períodos de tempo (2). Uma queixa frequente dos pais é que o bebê não gosta do colo ou rejeita o aconchego (1-3). Mais tarde os pais notarão que o bebê não imita, não aponta no sentido de compartilhar sentimentos ou sensações e não aprende a se comunicar com gestos comumente observados na maioria dos bebês, como acenar as mãos para cumprimentar ou despedir-se. Geralmente, estas crianças não procuram o contato ocular ou o mantêm por um período de tempo muito curto, não buscam interação com outras pessoas e as ignoram quando lhes pedem atenção; frequentemente preferem ficar sozinhas. É comum o aparecimento de estereotipias, que podem ser movimentos repetitivos com as mãos ou com o corpo, a fixação do olhar nas mãos por períodos longos e hábitos como o de morder-se, morder as roupas ou puxar os cabelos, correr de um lado para o outro ou ficar girando ao redor de si mesmas (1-3). O surgimento da fala pode estar atrasado e boa parte das crianças não chega a desenvolver fala funcional, pronunciando ou balbuciando algumas poucas palavras. Quando a fala não aparece até os cinco anos, é menos provável que isso venha a ocorrer mais tarde. Aquelas que falam costumam não usar a primeira pessoa (“eu”), referindo-se a si mesmas na terceira pessoa (1). Problemas de alimentação são frequentes, podendo se manifestar pela recusa a se alimentar ou gosto restrito a poucos alimentos. Dificuldade importante na modificação da alimentação. Algumas crianças, por exemplo, só bebem algo se utilizarem sempre o mesmo copo. Outras, para se alimentarem, exigem que os alimentos estejam dispostos no prato sempre da mesma forma. Qualquer mudança de sua rotina pode desencadear acentuadas crises de choro, grito ou intensa manifestação de desagrado (2).


Complementação
O que se costuma chamar de “autismo” é tratado na literatura médica como Transtorno do Espectro Autista (TEA), porque envolve uma variedade de apresentações clínicas relacionadas principalmente com dificuldades de comunicação e relacionamento social, que vão desde quadros mais leves até manifestações mais graves e com comprometimento importante. Em geral, o transtorno desenvolve-se tipicamente antes dos três anos de idade, tendo uma maior incidência nos meninos em relação às meninas (1,4), porém, meninas autistas tendem a ter danos intelectuais mais severos (5). Suas causas são desconhecidas (4).
Diz-se que o autismo é um distúrbio do comportamento que consiste em uma tríade de dificuldades (3,4):

1- Dificuldade de comunicação – caracterizada pela dificuldade em utilizar com sentido todos os aspectos da comunicação verbal e não verbal. Isto inclui gestos, expressões faciais, linguagem corporal, ritmo e modulação na linguagem verbal. Portanto, dentro da grande variação possível na severidade do autismo, poderemos encontrar uma criança sem linguagem verbal e com dificuldade na comunicação por qualquer outra via, como podemos, igualmente, encontrar crianças que apresentam linguagem verbal, porém esta é repetitiva e não comunicativa (1-4). Algumas crianças com TEA repetem palavras que acabaram de ouvir (ecolalia imediata). Outras podem emitir falas ou slogans e vinhetas que ouviram na televisão sem sentido contextual (ecolalia tardia) (2).

2- Dificuldade de sociabilização – este é o ponto crucial no autismo, e o mais fácil de gerar falsas interpretações. Significa a dificuldade em relacionar-se com os outros, a incapacidade de compartilhar sentimentos, gostos e emoções e a dificuldade na discriminação entre diferentes pessoas. Os jogos de faz-de-conta e as brincadeiras de imitação estão comumente ausentes. O foco de interesse da criança pode estar exageradamente ligado a um objeto ou a uma atividade específica. Pode haver apego e manipulação do objeto selecionado, que nem sempre é um brinquedo e não parece ser usado simbolicamente. Há preocupação com a manutenção de rotinas, rituais e ordenação de brinquedos ou outros objetos, surgindo angústia se algo se modifica (1,2).

3- Dificuldade no uso da imaginação– se caracteriza por rigidez e inflexibilidade e se estende às várias áreas do pensamento, linguagem e comportamento da criança. Isto pode ser exemplificado por comportamentos obsessivos e ritualísticos, compreensão literal da linguagem, falta de aceitação das mudanças e dificuldades em processos criativos. Esta dificuldade pode ser percebida por uma forma de brincar desprovida de criatividade e pela exploração peculiar de objetos e brinquedos (2-4). Os movimentos de alguns objetos, especialmente os que são contínuos e previsíveis (como o girar de um ventilador ou das rodas de um carrinho ou o fluxo de água de uma torneira), exercem uma grande atração sobre essas crianças, que podem passar longos períodos absorvidas em sua observação (1,2). É importante que o processo diagnóstico de TEA seja realizado por uma equipe multiprofissional com experiência clínica e que não se limite à aplicação de testes e exames.  Portanto, é preciso avaliar a necessidade de exames neurológicos, metabólicos e genéticos que podem complementar este processo (1).

Os sinais precoces são muito sensíveis para perturbações da comunicação e interação, mas pouco específicos para o TEA propriamente dito, o que possibilita que avaliações, escalas e pesquisas apontem sempre no sentido de riscos para o transtorno ou indicadores de perturbações da interação e da comunicação. Pelo fato de os sinais apresentarem mais sensibilidade do que especificidade, é oficialmente indicado que o diagnóstico definitivo de TEA seja fechado a partir dos três anos, o que não desfaz o interesse da avaliação e da intervenção o mais precoce possível, para minimizar o comprometimento global da criança (1).

Uma vez estabelecido o diagnóstico de TEA, o momento da notícia deste diagnóstico deve ser cuidadosamente preparado, pois será muito sofrido para família e terá impacto em sua futura adesão ao tratamento (2).

A apresentação do diagnóstico deve ser complementada pela sugestão de tratamento, incluindo as atividades sugeridas no projeto terapêutico singular, que se baseia nas ofertas de cuidado construído a partir da identificação das necessidades reais dos pacientes e de suas famílias. O encaminhamento para os profissionais que estarão envolvidos no atendimento do caso deve ser feito de modo objetivo e imediato, respeitando o tempo necessário para cada família elaborar a nova situação (2).

É importante esclarecer que o quadro do autismo é uma “síndrome”, que significa “um conjunto de sinais clínicos”, conjunto que define uma certa condição de vida diferente daquela até então experimentada pela família. Além disso, tal condição impõe cuidados e rotinas diferenciadas. É igualmente importante esclarecer que os cuidados serão compartilhados entre a equipe profissional responsável pelo tratamento e a família. Ou seja, é importante fazê-la notar que ela não estará sozinha nesse processo e que terá respeitada sua autonomia na tomada das decisões (2).

O tratamento da pessoa com TEA deve oferecer recursos e alternativas para que se ampliem seus laços sociais, suas possibilidades de circulação e seus modos de estar na vida. Deve ampliar suas formas de se expressar e se comunicar, favorecendo sua inserção em contextos diversos (1). Como dito anteriormente, o recomendado é que uma equipe multidisciplinar avalie e desenvolva um programa de intervenção orientado a satisfazer as necessidades particulares de cada indivíduo. Dentre alguns profissionais que podem ser necessários, estão: psiquiatras, psicólogos, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais, fisioterapeutas e educadores físicos (6).

ATRIBUTOS APS

É sempre importante, principalmente no caso do acompanhamento de pessoas com TEA, definir alguém da equipe que ocupe o lugar do técnico de referência, podendo ser esta a pessoa de escolha do usuário, por quem ele tenha mais “afinidades”. O que é privilegiado/escolhido (sejam objetos, interesses, pessoas e formas de comunicação) pela pessoa com transtorno do espectro do autismo deve ser considerado e valorizado! (1)

Este profissional e/ou a equipe de saúde devem favorecer o cuidado contínuo, servir de ponte entre famílias, os demais profissionais e os serviços e zelar pela garantia de encaminhamentos necessários de forma implicada, responsável e respeitosa (1).

Bibliografia Selecionada:

  1. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Especializada e Temática. Linha de cuidado para a atenção às pessoas com transtornos do espectro do autismo e suas famílias na Rede de Atenção Psicossocial do Sistema Único de Saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 2015. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/linha_cuidado_atencao_pessoas_transtorno.pdf>. Acesso em: 16 maio 2016.
  2. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Diretrizes de Atenção à Reabilitação da Pessoa com Transtornos do Espectro do Autismo (TEA). Brasília : Ministério da Saúde, 2014. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/diretrizes_atencao_reabilitacao_pessoa_autismo.pdf>. Acesso em: 16 maio 2016.
  3. MELLO, Ana Maria S. Ros de, Associação amigos do autista – AMA. Autismo: guia prático. 7 ed. Brasília: CORDE, 2007 . Disponível em:<https://www.ufrgs.br/telessauders/documentos/biblioteca_em_saude/055_material_saude_livro_autismo.pdf>. Acesso em: 16 maio 2016.
  4. DUNCAN, Bruce Bartholow et al. Medicina ambulatorial: condutas de atenção primária baseadas em evidências. 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 2013.
  5. VOLKMAR, Fred, et al. Practice parameter for the assessment and treatment of children and adolescents with autism spectrum disorder. Journal of the American Academy of Child & Adolescent Psychiatry, 2014; 53(2) : 237-257. Disponível em: <http://www.jaacap.com/article/S0890-8567(13)00819-8/pdf> . Acesso em: 16 maio 2016.
  6. AMORIM, Letícia Calmon Drummond, Associação de Amigos do Autista – AMA. Autismo: Tratamento. 2011. Disponível em: <http://www.ama.org.br/site/tratamento.html>. Acesso em: 16 maio 2016.