Os fatores de risco já estabelecidos para a formação de cálculos urinários (problema também denominado nefrolitíase, urolitíase ou, popularmente, pedras nos rins) podem ser divididos em intrínsecos, que compreendem idade, sexo e hereditariedade, e fatores extrínsecos, como os geográficos e climáticos (por exemplo, temperaturas ambientais mais elevadas e menor umidade do ar), a dieta, o baixo consumo de água, entre outros.1,2
A nefrolitíase é a terceira causa mais comum entre as doenças do trato urinário (atrás apenas das infecções e das patologias da próstata), mas é considerada como a de maior morbidade.1 A apresentação clínica característica dos cálculos urinários é a cólica renal, cuja estimativa de incidência ao longo da vida, considerando a população geral nos países desenvolvidos, é de 10 a 15%, sendo os homens mais afetados do que as mulheres. Sabe-se, ainda, ser cólica renal uma condição recorrente (seguimentos de 5 a 10 anos de duração mostraram que cerca de 50% das pessoas voltam a apresentar o quadro clínico sugestivo; em 20 anos de seguimento, a recorrência chegou a 75%).2
Sobre a idade, observa-se maior incidência de litíase entre os 20 e os 40 anos de vida. Conforme já mencionado, também o sexo masculino é um fator de risco, haja vista ser a formação de cálculos duas a três vezes mais frequente em homens do que em mulheres. Quanto à etnia, os mais acometidos são os indivíduos brancos, seguidos pelos asiáticos e, então, pessoas de cor negra.1 Em relação ao sobrepeso e à obesidade como fatores de risco para a formação de nefrolitíase, apesar de não haver consenso sobre tal associação, sugere-se que ela exista.1,2
Há evidências de que seja maior a probabilidade de os cálculos urinários ocorrerem em indivíduos cujas ocupações são sedentárias. Ressalta-se, no entanto, que é difícil avaliar se a ocupação em si é um fator de risco decisivo para litíase ou se o tipo de trabalho apenas influencia outros fatores ambientais que facilitariam a formação de litíase urinária, por exemplo, temperatura, umidade e padrão de alimentação das pessoas.1
A história familiar positiva para cálculo urinário não é incomum entre pacientes com litíase renal, variando em 25 a 50% dos casos.3 Contudo, tais percentuais não significam necessariamente que a calculose seja uma doença meramente hereditária do ponto de vista do DNA, mas que membros da mesma família, além de compartilharem a herança genética, costumam também apresentar o mesmo modo de vida e os mesmos hábitos alimentares.1
A ingestão de líquidos (preferencialmente água) é uma medida fundamental para evitar a formação e a recorrência dos cálculos urinários, tanto pelo efeito diluente dos líquidos quanto por sua capacidade de reduzir a chamada razão de supersaturação da urina. Há consenso de que a ingestão diária de líquidos deveria promover uma excreção urinária de pelo menos 2 a 2.5 L por dia, distribuídos uniformemente ao longo do dia.1 Essa ingestão de líquidos em abundância é a medida preventiva para nefrolitíase com melhor eficácia documentada (D).2 Há, porém, evidências apontando que a água possuidora de grande concentração de cálcio ou magnésio seria mais litogênica.1 E, quando se fala em ingestão de líquidos, é prudente não se incluir refrigerantes na lista, pois é sabido que reduzir o consumo dessas bebidas gaseificadas pode prevenir a recorrência das cólicas renais (D).2
Salienta-se também o importante papel da dieta sobre a formação de cálculos urinários,1,2 logo é sensato avaliar de modo pormenorizado, com a ajuda de nutricionista do Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF) ou outro local, os hábitos alimentares dos pacientes com esse problema. Como informações gerais, vale registrar aqui que dietas com menores valores energéticos diminuem a formação de cálculos.3 Também é conhecido o fato de que o nutriente que tem efeito universal na maioria dos parâmetros urinários envolvidos na formação de cálculos é a proteína, notadamente a proteína animal. Hábitos alimentares inapropriados, como um grande consumo desse tipo de proteína, podem favorecer hipercalciúria (induzida, entre outros fatores, por uma maior reabsorção óssea), hiperoxalúria (devido a uma maior síntese de oxalato), hiperuricosúria (pela sobrecarga de purina), hipocitratúria (devido a maior reabsorção tubular de citrato) e diminuição do pH urinário.1
Ainda na seara da alimentação, estudiosos aconselham algo, à primeira vista, paradoxal: maior ingestão de cálcio para prevenir litíase urinária.1,2 Isto é possível porque o consumo de pelo menos 800 mg/dia de cálcio reduz a absorção intestinal de oxalato, um dos principais formadores de cálculos. O oxalato pode ser encontrado em determinados alimentos, como chocolate preto e nozes, os quais, portanto, devem ser evitados em quantidades excessivas. Sugere-se, ainda, evitar consumo excessivo de sódio como estratégia razoável para a prevenção da formação de cálculos de cálcio recorrentes. As pessoas com nefrolitíase recorrente, habitualmente, não ingerem maiores quantidades de sódio do que indivíduos sem essa condição, porém o primeiro grupo é considerado mais sensível ao sódio.1
É possível individualizar a abordagem preventiva secundária da litíase renal a partir da análise da composição do cálculo urinário e da realização de um painel bioquímico extenso da pessoa, analisados por médicos urologistas experientes no assunto ou médicos de APS que disponham dos recursos e conhecimento para tal. Porém, mesmo em países economicamente mais desenvolvidos, tal abordagem somente é considerada custo-efetiva para pessoas que tenham apresentado dois ou mais episódios de cólica renal durante a vida.2
As medidas preventivas para urolitíase são bons exemplos da necessidade de valorizarmos e colocarmos em prática os atributos da atenção primária à saúde, em especial uma abordagem que prime pela integralidade e a longitudinalidade do cuidado às pessoas.4