Como é constituída e estruturada uma rede de atenção às vítimas de violência envolvendo a Atenção Básica?

| 4 abril 2018 | ID: sofs-37667
Solicitante:
CIAP2:
DeCS/MeSH: , ,

A Rede de atenção às vítimas de violência precisa ser constituída, dimensionada e articulada, a partir da realidade local envolvendo as equipes de Atenção Básica, Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF), Núcleo de Prevenção das Violências e Promoção da Saúde (NUPREVS), serviços de atenção especializada de Saúde Mental e hospitais (municipais, estaduais e federais) com possibilidade de atendimento 24horas, sete dias por semana. Também recomenda-se envolver diferentes instituições ligadas à temática, por exemplo: serviços governamentais, não governamentais, serviços da política de assistência social, Sistema de Justiça, Segurança Pública, Ministério Público, Defensoria Pública, Varas da Infância e Juventude, Conselho Tutelar e de Direitos, Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) e Centros de Referência Especializada de Assistência Social (CREAS), entidades da sociedade civil e comunidade(1,2).


A estratégia organizacional dos serviços e profissionais em rede busca a ampliação da resolubilidade e a integralidade da atenção(1), além de compartilhar intervenções assistenciais, fortalecer a responsabilização dos serviços e envolver dos profissionais numa cadeia de produção de cuidado em saúde e de proteção social(3).
A estruturação da rede de atenção às vítimas de violência inicia-se pelo mapeamento de todos os serviços/instituições governamentais e não governamentais que atuam como “porta de entrada” ou primeiro atendimento às pessoas tanto para as violências agudas quanto as violências crônicas, bem como aquelas que se dedicam ao cuidado, promoção, defesa e proteção dos direitos das pessoas no município ou em serviços regionalizados se for o caso. Além disso, sugere-se identificar a existência de protocolos e fluxos de atendimento; articulação em rede intra e intersetorial, tipo de atendimento prestado, endereço, telefone, e-mail e horário de atendimento de cada instituição identificada(1).
Após o mapeamento, faz-se necessário discutir, planejar, pactuar e formalizar em atos normativo (lei, decreto, planos de ação, protocolos de interação, carta de compromisso) os fluxos de interação e atendimento, as ações, os mecanismos de acesso, os critérios de priorização, área de abrangência, as ferramentas tecnológicas compatíveis para o manejo e discussão dos casos em cada ponto da rede de forma articulada entre as instituições (dentro e fora da atenção básica)(2,3). Para isso, espera-se, que as equipes de atenção básica Estratégia Saúde da Família (ESF) e Núcleo de Apoio a Saúde da Família (NASF) criem estratégias para realizar fóruns intersetoriais, reuniões entre os serviços, além de contarem com listas de e-mails, telefones, catálogos e guias de referenciamento mútuo atualizado e sites para consultas. Esses dispositivos apoiarão a articulação da rede intersetorial de atendimento às vítimas de violência, contribuindo também para a garantia dos direitos humanos e sociais dos cidadãos(5,6). Esses dispositivos de articulação devem ser debatidos e planejados periodicamente de modo a implantar uma cultura de monitoramento e avaliação(1).
Sugere-se que os gestores locais articulem-se com serviços e instituições de ensino, promoção, proteção e defesa dos direitos para a inclusão ações de educação permanente e continuada dos profissionais de saúde para qualificar o processo de trabalho das equipes de saúde em relação ao acolhimento, atendimento, notificação, prevenção, promoção da cultura da paz e seguimento do caso na rede de cuidado e proteção social(1). A qualificação profissional faz-se necessário tento em vista os diferentes aspectos a serem superadas para a efetivação de rede intersetorial de atendimento as vítimas de violência, tais como: 1) vínculos, objetivos e culturas (linguagens) institucionais diversos; 2) autonomia completa dos setores; 3) pequeno reconhecimento mútuo e muita desconfiança entre os setores; 4) fluxos baseados em conhecimento de pessoas – relações pouco institucionalizadas; 5) triagens mais que encaminhamentos, sem proposta assistencial específica; 6) fragilidade dos serviços – instabilidade das políticas de governo e das gestões; 7) imaturidade dos processos de compartilhamento da tomada de decisão assistencial; 8) diferença entre as propostas e finalidades dos trabalhos, o que representa uma barreira para o atendimento intersetorial e multiprofissional, nem sempre percebida de forma clara pelos profissionais(3,4).
A superação desses obstáculos não é simples, implica uma definição clara do princípio comum que irá reger a perspectiva de atuação em rede(4). Exigem políticas públicas amplas e articuladas nas mais diferentes esferas da vida social, como saúde, educação, segurança pública, assistência social, justiça, movimentos de mulheres e controle social(1). É preciso, portanto, realizar a gestão colegiada da rede de cuidado e de proteção social de pessoas em situação de violências e suas famílias, será importante para articular, mobilizar, planejar, acompanhar e avaliar as propostas assistenciais e educativas(3). Por isso, sugere-se ajustar definições e projetos, unificar campanhas, discussões, construir a interação/ comunicação interinstitucional para se produzir a assistência em conjunto(3), criar de protocolos de acolhimento e atendimento humanizado (abordando os aspectos técnicos e éticos), com normativas específicas, podendo ser utilizados ou adaptados os protocolos e normas técnicas publicadas pelo Ministério da Saúde(1) já existentes, por exemplo, a de Prevenção e Tratamento dos Agravos Resultantes da Violência Sexual da Mulher e Adolescente(7) e Protocolo da Saúde da Mulher(8) entre outros. As estratégias de acompanhamento e apoio técnico planejado precisam ser pensadas de acordo com o público alvo pois, há uma pluralidade de casos de violência que necessitam de propostas assistenciais, necessariamente, plurais(2).
Dessa forma, é possível termos como resultado a intersetorialidade, com base em diálogos e trocas que atingem as práticas técnicas e também os saberes que as envolvem. Contudo, neste processo não se pode perder de vista a importância dos próprios trabalhos especializados ou específicos de cada setor ou de cada ramo profissional(2). A garantia destes deve ser buscada, porém, em um modelo assistencial que permita a mútua colaboração entre esses trabalhos, em que seus agentes efetivamente se disponham em relações de intersubjetividade e não de isolamento(3).

Bibliografia Selecionada:

1. Coelho BSE. Atenção a homens e mulheres em situação de violência por parceiros íntimos. Florianópolis : Universidade Federal de Santa Catarina, 2015:298-317. Disponível em: https://unasus-cp.moodle.ufsc.br/enrol/index.php?id=49 [acessado em 9 mar. 2017]
2. Florianópolis. Secretaria Estadual de Saúde de Santa Catarina. Atenção às Pessoas em Situação de Violência. Disponível em http://portalses.saude.sc.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=4446&Itemid=625 [acesso em 2 mar.2017]
3. Kiss LB, Schraiber LB, d’Oliveira AFPL.Possibilidades de uma rede intersetorial de atendimento a mulheres em situação de violência. Interface (Botucatu) [Internet]. 2007;11(23):485-501. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1590/S1414-32832007000300007  [acesso em 2 mar.2017]
4. Schraiber LB, D´Oliveira AFPL, Hanada H, Jiss L. Assistência a mulheres em situação de violência – da trama de serviços à rede intersetorial. Athenea Digital. Revista de pensamiento e investigación social. 2012;12(3):237-54. Disponível em: http://atheneadigital.net/article/view/v12-n3-schraiber-pires-hanada-etal/1110-pdf-pt [acesso em 2 mar.2017]
5. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Núcleo de Apoio à Saúde da Família: ferramentas para gestão e para o trabalho cotidiano. (Cadernos de Atenção Básica, n.39). 2014:80-95. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/nucleo_apoio_saude_familia_cab39.pdf [acesso em 2 mar.2017]
6. Brasil. Presidência da República. Casa Civil.  Decreto no 7.958, de 13 de março de 2013. Estabelece diretrizes para o atendimento às vítimas de violência sexual pelos profissionais de segurança pública e da rede de atendimento do Sistema Único de Saúde. 2013. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2013/Decreto/D7958.htm [acesso em 2 mar.2017]
7. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes : norma técnica. 3. ed. atual. e ampl., 1. reimpr. – Brasília : Ministério da Saúde. (Série A. Normas e Manuais Técnicos) (Série Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos ; Caderno n. 6). 2012:124p. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/prevencao_agravo_violencia_sexual_mulheres_3ed.pdf [acessado em 9 mar.2017]
8. Brasil. Ministério da Saúde. Instituto Sírio-Libanês de Ensino e Pesquisa. Protocolos da Atenção Básica : Saúde das Mulheres. Brasília. Ministério da Saúde. 2016:213-230. Disponível em: http://189.28.128.100/dab/docs/portaldab/publicacoes/protocolo_saude_mulher.pdf [acessado em 9 mar.2017].