O acolhimento às pessoas transexuais requer do profissional da saúde uma visão plural de gênero e da sexualidade humana para que muitas das discriminações que esse público experiencia(1) sejam evitadas. O respeito do uso nome social bem como o respeito pela forma que a pessoa se autorrefere e se auto-identifica é a chave para um acolhimento humanizado(2). Compreender que existe um olhar rígido para as questões de gênero é uma forma de minimizar a violência e a discriminação contra esta população(3).
A discriminação no acolhimento é uma queixa recorrente trazida pelas pessoas transexuais(2). Ela frequentemente acontece quando não há o respeito do nome social e quando o profissional da saúde acredita que sua condição está atrelada a uma doença(2). É importante lembrar que, o Ministério da Saúde através da nota técnica nº 18/2014 prevê o uso do nome social no cartão SUS como direito de qualquer pessoa que se identifique enquanto transexual(1). O respeito ao nome social garante cidadania e diminui os efeitos da vulnerabilidade em saúde a que as pessoas estão expostas, pela desinformação e exclusão decorrentes do preconceito e discriminação(1).
O conhecimento de alguns conceitos que se referem à condição destas pessoas pode auxiliar para a melhoria no acolhimento a essa população:
Orientação sexual: “capacidade de cada pessoa de ter uma profunda atração emocional, afetiva ou sexual por indivíduos de gênero diferente, do mesmo gênero ou de mais de um gênero, assim como ter relações íntimas e sexuais com essas pessoas”(4). Ex: homossexuais (gays, lésbicas) e bissexuais.
Identidade de gênero: “experiência interna e individual do gênero de cada pessoa, que pode ou não corresponder ao sexo atribuído no nascimento, incluindo o senso pessoal do corpo (que pode envolver, por livre escolha, modificação da aparência ou função corporal por meios médicos, cirúrgicos ou outros) e outras expressões de gênero, inclusive vestimenta, modo de falar e maneirismos”(4). Ex: transexuais (mulheres trans e homens trans) e travestis (sempre há identificação com o gênero feminino)
Mulher Transexual: é uma identidade de gênero, e se refere àquela pessoa que se identifica como mulher, mas nasceu com uma genitália masculina(2).
Homem transexual: é uma identidade de gênero, e se refere àquela pessoa que se identifica como homem, mas nasceu com uma genitália feminina(2).
A transexualidade é uma condição autorreferida, portanto, ao contrário do que muitos pensam, nem todas as pessoas transexuais realizaram uma cirurgia de redesignação sexual, pois, basta a pessoa se identificar como transexual para que seja atribuída essa condição à ela.
Algumas recomendações podem ser seguidas pelos profissionais da saúde para o acolhimento a todas as pessoas LGBT(5):
Profissional:
– Familiarizar-se com os recursos on-line e locais disponíveis para as pessoas LGBT;
– Reconhecer os diferentes movimentos organizados e/ou ONG’s LGBT;
– Procurar informações para se manter atualizado sobre temas de saúde LGBT.
Interação Profissional-Paciente:
– Evite assumir a orientação sexual ou identidade de gênero considerando a aparência ou outras características da pessoa;
– Esteja ciente de preconceitos, esteriótipos e outras barreiras de comunicação
– Use uma linguagem neutral e inclusiva;
– Permita que as pessoas se auto-identifiquem e usem seu nome social. Tenha em consideração que esta autoidentificação é um processo individual;
– Não faça julgamentos ou comentários morais;
– Conserve uma linguagem corporal neutral;
– Normalize os antecedentes ou comportamentos sexuais, perguntando-os para todos os seus pacientes.
A Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais do Ministério da Saúde tem como objetivo “promover a saúde integral de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais, eliminando a discriminação e o preconceito institucional, bem como contribuindo para a redução das desigualdades e a consolidação do SUS como sistema universal, integral e equitativo”(1). Nessa política destacam-se as seguintes ações: garantir acesso, redução de risco, atuar na eliminação do preconceito e da discriminação da população LGBT, garantir o uso do nome social e inclusão de temáticas relacionadas com estes grupos. Além desta política, o Brasil também é signatário dos Princípios de Yogyakarta(4), cartilha produzida num encontro realizado em 2006 para discutir os direitos humanos relativos à orientação sexual e identidade de gênero em âmbito internacional.
Um acolhimento bem realizado a essa população atende ao princípio de integralidade da previsto na Atenção Primária de Saúde bem como poderá contribuir ao acesso dessas pessoas ao SUS.
1. Brasil .Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa. Departamento de Apoio à Gestão Participativa. Política Nacional da Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais. Brasília: Ministério da Saúde, 2013. 32 p. 1ª Reimp. [citado em 29 Out. 2017]. Disponível em:<http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_saude_lesbicas_gays.pdf>.
2. Rodriguez AMM. Webconferência sobre Identidade(s) de Gênero: Trans & Saúde [recurso eletrônico]. Sistema Catarinense de Telemedicina e Telessaúde: Telessaúde Santa Catarina: Ministério da Saúde. 03 Dez 2014 [citado em 29 Out 2017].
3. Njaine K, Silva ACLG, Rodriguez AMM, Gomes R, Delziovo CR. Violência e perspectiva relacional de gênero. “In”: Coelho, EBS, organizadora. Atenção a homens e mulheres em situação de violência por parceiros íntimos. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina; 2015. p. 147-194.
4. Princípios de Yogyakarta. Princípios sobre a aplicação da legislação internacional de direitos humanos em relação à orientação sexual e identidade de gênero. [Internet] 2006. [citado em 29 Out 2017]. Disponível em: http://www.yogyakartaprinciples.org/
5. Tschurtz B, Burke A. Advancing Effective Communication, Cultural, Competence, and Patient and Family Centered Care for the Lesbian, Gay, Bisexual, and Transgender (LGBT) Community. USA: The California Endowment. 2011. Disponível em: https://www.jointcommission.org/assets/1/18/LGBTFieldGuide_WEB_LINKED_VER.pdf
6. Mello MMC. Webpalestra: A população travesti e transexual no SUS. [Internet]. Sistema Catarinense de Telemedicina e Telessaúde: Telessaúde Santa Catarina: Ministério da Saúde. 24 Mai 2017 [citado em 29 Out 2017]. Disponível em: http://telessaude.ufsc.br/teleeducacao/
7. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa. Departamento de Apoio à Gestão Participativa. Transexualidade e Travestilidade na saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 2015. [citado em 29 Out. 2017]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/transexualidade_travestilidade_saude.pdf